Muito mudou no mapa eleitoral americano na última década, em particular com a eleição de Donald Trump em 2016 e Joe Biden em 2020. Longe vão os tempos em que todos os que seguem as eleições presidenciais nos Estados Unidos de perto esperavam acordados até horas tardias (madrugada na Europa) à espera dos resultados na Florida ou no Ohio.

Há quatro anos, a vitória nas presidenciais foi decidida em estados em que a diferença de votos entre os candidatos foi pouco superior a 10 mil. Este ano, algumas dessas batalhas vão ser reeditadas e as sondagens não têm boas notícias para Joe Biden, que parte com atraso em cinco dos seis estados potencialmente decisivos nestas eleições.

Será que Joe Biden vai conseguir repetir a vitória em estados do rust belt como Michigan, Pensilvânia e Wisconsin, e defender a chamada muralha azul (blue wall) ou conseguirá Donald Trump reeditar a surpresa conseguida há oito anos. Veja aqui o que está em causa.

Arizona

  • 11 votos no colégio eleitoral;
  • Joe Biden venceu por pouco em 2020 | Donald Trump ganhou em 2016;
  • Sondagens dão favoritismo a Donald Trump (ver aqui).

O Arizona é um estado que, tradicionalmente, vota pelo Partido Republicano. Nos últimos 72 anos, só por duas vezes os eleitores do Arizona escolheram presidentes democratas – Bill Clinton em 1996; e Joe Biden em 2020. Há quatro anos, a vitória de Biden fez-se por uma margem de apenas 10.457 votos num total de quase 3,4 milhões de votos.

A imigração tem sido a principal questão na campanha no Arizona, e arma de arremesso dos republicanos contra a administração Biden. O Arizona partilha uma fronteira a sul com o México que se estende por cerca de 600 quilómetros, e o número de entradas ilegais – em particular em Tucson – continua a aumentar, mesmo numa altura em que a média nacional tem vindo a diminuir. A incapacidade dos partidos de chegarem a um acordo, e da administração de implementar medidas eficazes pode prejudicar Joe Biden, mais tendo em conta que este estado tem uma governadora democrata.

Já o aborto, que estava a ser uma questão discutida com menos intensidade, voltou ao centro do debate depois de o Supremo Tribunal de Justiça do Arizona ter decidido repor uma lei antiaborto de 1864 – que proíbe o aborto em quase todos os cenários -, em resultado da reavaliação do caso Roe V. Wade pelo Supremo Tribunal dos Estados Unidos.

Georgia

  • 16 votos no Colégio Eleitoral.
  • Joe Biden venceu em 2020 | Donald Trump ganhou em 2016;
  • Donald Trump à frente nas sondagens por uma margem considerável (ver aqui).

Um reduto democrata praticamente desde a fundação dos Estados Unidos, o estado que deu ao mundo Martin Luther King Jr., Ray Charles e Jackie Robinson ajudou a eleger presidentes democratas como Ulysses S. Grant, Woodrow Wilson, Franklin Delano Roosevelt e John Francis Kennedy Jr.

A tendência mudou em 1964 quando Lyndon Johson perdeu para Barry Goldwater. Desde então, a Georgia apenas escolheu os democratas em 1976 e 1980 (Jimmy Carter, nativo da Georgia), em 1992 (Bill Clinton v. George H. W. Bush), e Joe Biden em 2020, mas pela mais pequena das margens – apenas 11.779 votos, num total de quase 5 milhões de votos.

Duas grandes questões prometem animar o debate político presidencial na Georgia nesta altura. A primeira é a acusação criminal contra Donald Trump. Em agosto do ano passado, Donald Trump foi acusado de 13 crimes, entre eles conspiração para mudar o resultado das eleições presidenciais de 2020, extorsão e associação criminosa. O telefonema gravado – e divulgado – de Donald Trump a pressionar o secretário de estado Brad Raffensperger (republicano) para encontrar votos suficientes para mudar o resultado a seu favor é uma das peças chave da acusação. Este será um dos principais campos da batalha sobre as acusações (falsas) de que a eleição foi falseada em 2020.

O segundo grande tema é a economia. Numa altura em que a economia americana cresce, o desemprego está em níveis historicamente baixos, e a inflação parece estar sob controle, Joe Biden tem a seu favor na Georgia um influxo de investimentos industriais, entre eles a nova fábrica de baterias da Hyundai e da LG – um investimento de 4,3 mil milhões de dólares –, e a fábrica de painéis solares e componentes da Hanwha Qcells, um aumento em 2,5 mil milhões do investimento desta empresa (também) sul-coreana. Ambos os investimentos acontecem devido aos apoios ao investimento do Inflation Reduction Act, o plano de investimentos de Joe Biden.

Ainda assim, as sondagens dão vantagem a Donald Trump.

Michigan

  • 15 votos no Colégio Eleitoral;
  • Joe Biden venceu em 2020 | Donald Trump ganhou em 2016;
  • Sondagens dão vantagem a Trump (ver aqui);

Desde Bill Clinton que o Michigan parecia ter virado completamente à esquerda. Até 2016, quando Donald Trump venceu, por uma pequena margem (menos de 11 mil votos), os 15 votos do colégio eleitoral que este estado representa. Joe Biden venceu em 2020 e tudo parecia indicar que seria o favorito, até que o apoio da administração norte-americana a Israel durante a guerra em Gaza mudou tudo.

Nas primárias dos democratas, os mais de 100 mil eleitores de ascendência árabe, e de cidades universitárias como Ann Arbor, fizeram questão de demonstrar o quanto repudiam as decisões da presidência, votando como não comprometidos. Mesmo com uma governadora democrata, Gretchen Whitmer, o voto de protesto pode ser demasiado forte contra Biden.

O debate passará também pela economia. Joe Biden deverá continuar a promover a sua estratégia de uma renovada industrialização, em particular a promoção de investimentos verdes, e Donald Trump contra essas políticas ambientais e a promoção de carros elétricos. No final, Michigan pode ser decisivo para escolher o próximo presidente. Como disse Donald Trump, “se ganharmos o Michigan, ganhamos a eleição”.

Nevada

  • 6 votos no Colégio Eleitoral;
  • Joe Biden venceu em 2020 | Hillary Clinton ganhou em 2016;
  • Sondagens dão vantagem a Donald Trump (ver aqui).

O Nevada é um swing state desde a sua existência, tendo votado intermitentemente a favor de democratas e republicanos (e até do defunto agrário, anti monopolista Greenpack Party) desde que foi constituído enquanto Estado em 1864. Desde 1976, o Estado repartiu o seu apoio de forma muito igualitária: seis candidatos republicanos e seis democratas.

As principais preocupações dos eleitores do Nevada, de acordo com um inquérito realizado pelo Emerson College Polling, são a economia e imigração. No que à economia diz respeito, o Estado, em particular Las Vegas, foram muito afetados pela pandemia e a sua recuperação está a ser mais débil que o resto do país. O Nevada regista a maior taxa de desemprego entre dos EUA. Em simultâneo, os preços da habitação e da energia têm sofrido aumentos acentuados, com impacto significativo no rendimento disponível das famílias.

Quanto à imigração, o debate tem sido mais intenso. Joe Biden tem tentado culpar os republicanos por não permitirem a aprovação de uma reforma bipartidária do sistema de imigração. Já Donald Trump foi a Las Vegas dizer que essa reforma tinha como objetivo “continuar a invasão da América enquanto se envia milhares de milhões de dólares para a Ucrânia” e que os migrantes “envenenam o sangue do nosso país.”

As sondagens apontam para uma vantagem significativa de Donald Trump nas intenções de voto da população do Nevada, com três grupos fundamentais nesta decisão: 1) os sindicatos, dos mais poderosos do país, em particular nas áreas da hospitalidade e dos trabalhadores dos casinos; 2) a população hispânica (44% apoia Trump, e apenas 41% Biden); 3) e os eleitores caucasianos (51% apoiam Trump e 39% Joe Biden).

Apesar de no passado recente ter votado a favor dos democratas – Barack Obama em 2008 e 2012, Hillary Clinton em 2016 e Joe Biden em 2020 -, o Nevada elegeu um governador republicano em 2022, Joe Lombardo, que declarou o seu apoio a Donald Trump na corrida presidencial em janeiro deste ano.

Pensilvânia

  • 19 votos no Colégio Eleitoral;
  • Joe Biden venceu em 2020 | Donald Trump ganhou em 2016;
  • Joe Biden à frente nas sondagens pela margem mínima (ver aqui).

É um Estado duplamente especial para Joe Biden, porque foi lá que o atual Presidente dos Estados Unidos nasceu (na pequena cidade de Scranton, em 1942), e porque em 2020 lhe permitiu ultrapassar os 270 votos no colégio eleitoral que lhe garantiram a eleição. É também um estado querido dos democratas, que desde 1992 venceram sempre este estado, até que Donald Trump chocou a campanha de Hillary Clinton em 2016.

Parte do grupo de estados industriais que os americanos chamam de Rust Belt, a economia é o principal tema que preocupa os eleitores. Com um estado dividido entre trabalhadores das indústrias locais, em particular dos combustíveis fosseis como o petróleo, e eleitores mais progressistas das grandes cidades, preocupados com questões ambientais.

Com a suspensão das exportações de gás natural liquefeito (LNG, na sigla em inglês), Joe Biden tem tentado chegar aos eleitores mais progressistas, mas expôs-se aos ataques de Donald Trump, que tem promovido a exploração e exportação de petróleo e gás de xisto – mais perigosos na extração, e com maior impacto no ambiente, mas mais acessíveis à exploração por pequenos produtores.

Com quase 75% da população caucasiana, este será o grupo cujo apoio os candidatos irão disputar mais intensamente, numa tentativa de convencer os eleitores que o seu estado – que perdeu um voto no colégio eleitoral, um lugar no Congresso, e que tem perdido população todos os anos – está melhor com qualquer um deles.

Wisconsin

  • 10 votos no Colégio Eleitoral;
  • Joe Biden venceu em 2020 | Donald Trump ganhou em 2016;
  • Donald Trump à frente nas sondagens (ver aqui).

Nos últimos 40 anos, o Wisconsin só votou pelos republicanos numa eleição presidencial por duas vezes: com Ronald Reagan em 1984; e Donald Trump em 2016.

Em 2020, foi parte integral da vitória de Joe Biden e, prova disso, o atual Presidente tem feito do Wisconsin uma das suas prioridades. Foi a sua primeira visita doméstica após as eleições, logo em fevereiro de 2021. Regressou várias vezes em 2023 e em Janeiro aproveitou a inauguração de uma ponte com o Minnesota para promover o seu plano de infraestruturas.

Num Estado em que mais de 80% do eleitorado são caucasianos e de forte pendor agrário, a economia está no topo das preocupações. A estratégia de Joe Biden tem passado por retratar o cenário que encontrou como uma economia à beira do desastre, e o seu plano de infraestruturas e de apoio à indústria como a salvação, apelidando a América da capital mundial da indústria.

Já Donald Trump, de chamar a si o crédito dos ganhos nos mercados de capitais, e de caracterizar tudo o resto como “terrível”, acusando Biden de ser responsável pela inflação.

Ainda assim, os democratas acreditam que a eleição poderá chegar conseguindo o voto das mulheres, e dos jovens das cidades universitárias, estando por isso a apostar fortemente em temas como o aborto.

No entanto, a diferença poderá ser feita por quem conseguir motivar os seus eleitores para irem às urnas votar. Um inquérito realizado pela Marquette University Law School aponta para que apenas 49% dos sondados estão motivados para votar, muito abaixo dos 70% de há quatro anos.