Os ataques de 11 de setembro de 2001 em Nova Iorque, Washington e Pensilvânia provocaram muitas mudanças. Na política, na segurança, na forma como as sociedades ocidentais olham para estas questões, com consequências que ainda hoje sentimentos. Pela importância da memória das vítimas e do impacto que estes eventos ainda têm na nossa vida, a FLAD organizou uma conferência com dois portugueses com papeis centrais neste período: António Vitorino, então comissário europeu para a Justiça e Assuntos Internos e Francisco Seixas da Costa, na altura representante de Portugal junto das Nações Unidas.

“É importante não esquecer. É por isso também que quisemos estar aqui hoje e discutir o impacto que o 11 de setembro teve nas nossas vidas. Foram tempos de grande emoção. Foram tempos difíceis para todos, porque nos fizeram perceber de forma muito clara a nossa vulnerabilidade e trouxeram para a nossa casa a imagem de perigo iminente que marcou muitos de nós”, explicou a presidente da FLAD, Rita Faden.

Os ataques de 11 de setembro marcaram a memória de muitos de nós. Não foi diferente para os oradores da conferência que a FLAD organizou na passada quinta-feira, dia 9 de setembro, com a participação de António Vitorino, Francisco Seixas da Costa, moderada pela jornalista e diretora da Agência Lusa, Luísa Meireles.

António Vitorino estava no seu gabinete em Bruxelas quando o seu chefe de gabinete lhe pediu para ligar a televisão. O cenário era de tal forma inconcebível, com as Torres Gémeas em Nova Iorque a arder depois de serem atingidas por um avião, que ficou sem reação. Em direto, via o segundo avião a embater nas torres.

“Não vi o primeiro. Estávamos a ver na televisão e não era concebível. Inimaginável” – António Vitorino.

O embaixador Francisco Seixas da Costa estava em Nova Iorque, numa reunião nas Nações Unidas com os embaixadores de 15 países europeus, e relembrou o momento e a falta de perceção sobre o que de facto estava a acontecer, pelo menos na totalidade.

“Continuámos a discutir alguns detalhes sobre a cimeira das crianças, com o sentimento interior de que tudo aquilo era absurdo. Mas ninguém interrompeu aquilo, a presidência não interrompeu [a reunião]. Na altura não tivemos a noção de que era um ato terrorista, não tivemos noção de que devíamos parar. Acho que só caímos em nós quando as torres caíram. (…) Ficámos todos em estado de choque. As pessoas estavam a chorar na missão e a medir as consequências daquela barbárie, sem ter a consciência do que aquilo era.” – Francisco Seixas da Costa.

 

As consequências no rumo deste evento na geopolítica e da segurança foram dramáticas. “Penso que mudou a história”, explicou António Vitorino. O antigo comissário europeu explicou que, além de ser dramático em si, com milhares de mortos nas torres, o impacto do ataque, em território americano, levou a uma “rotura profunda da qual ainda hoje estamos a sofrer as consequências”.

Em primeiro lugar, porque expôs as diferenças na forma de abordar o fenómeno do terrorismo e da segurança entre EUA e União Europeia. Do lado dos EUA, a prioridade passou a ser o controlo da fronteira externa, mas na União Europeia a preocupação centrava-se no terrorismo gerado internamente, um problema que se tornou evidente em 2015 com os ataques em Paris. Por outro lado, o fenómeno do terrorismo islâmico mudou muito desde então.

“O fenómeno do terrorismo islâmico sofreu mutações muito violentas. Tentar ler o 11 de setembro à luz dos acontecimentos mais recentes do Afeganistão é enganador, é uma pura mistificação. Vemos com muita preocupação a expansão do terrorismo jihadista a todo o continente africano.” – António Vitorino.

Francisco Seixas da Costa apontou para as mudanças internas na sociedade e opinião pública americana, desde logo com aquilo que foi uma reversão da tendência de abertura que existia antes do 11 de setembro. “[Nos EUA] houve uma reversão daquilo que era a tendência na sociedade americana na altura, que era de acabar com o racial profilling e acabar com toda a discriminação.”

Por outro lado, as intervenções externas americanas, com o apoio da NATO – primeiro no Afeganistão e mais tarde no Iraque –, levaram a um cansaço da sociedade americana, e não só, com as operações externas, tal como se tinha visto com o Vietname nos anos 70.

“O que veio a seguir criou uma nova América no mundo, criou uma nova posição no mundo, e deixou criar uma nova China. É neste momento que vemos os EUA num movimento de humilhação, debaixo de uma retração, e com a sua opinião pública cansada da intervenção externa.” – Francisco Seixas da Costa.

A atual posição dos Estados Unidos em termos geoestratégicos, a mudança de postura da China para uma estratégia mais agressiva, e a sucessão de crises que o mundo tem vivido nas últimas décadas, tem provocado mudanças profundas, cujas consequências ainda não podem ser medidas na sua totalidade.

No entanto, António Vitorino lembrou que, apesar das diferenças, Estados Unidos e Europa trabalharam sempre em conjunto, pelo objetivo comum.

“Nunca se permitiu que essas diferenças vulnerabilizassem o objetivo comum, que era combater este novo terrorismo.”